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Mostrando postagens de janeiro, 2021

Cascas de limão

Eu te vi crescer... foram duas cascas de limão jogadas no jardim. Depois de um tempo, elas secaram e não serviam mais para colocar no teu chá. E depois do pé de limoeiro passar minha altura, eu não lembrava mais de como era seu início. Foram duas cascas jogadas no chão que me confundiram. Tínhamos nos despido de sentidos, mas o teu estar era apenas provisório. As besteiras ditas foram para confiar uma vida passageira. Na paz de uma guerra transcendental, não sentia mais nada além do teu peso e sua ausência era cheia de dor e vazio. Nada me fazia sentir aquele calor que só palavras bobas seriam capazes... nada, nenhuma vida completa teria esse sentimento tão valorizado. Era carência, como sempre é, nos infernos que nos munimos, seguíamos sozinhos, fingindo nunca ter nos tocado. O limão, amargo, agora seco, era soterrado pela terra e seguia seu curso natural. Quão belo, diria eu, é a passagem do tempo. Eu não preciso mais de uma casca apenas, quero a melodia amarga por completo. E até nã

O precipício

Um azul profundo. Um joelho colorido e dois olhos machucados e roxos. O precipício ao meu lado e o gramado verde se estendendo por uma vastidão pedregosa e escura. Se olhava por um, apenas a neblina e o azul. Se olhava o outro, terra e verde disfarçado de montanhas. Onde estavam essas pedras? Onde estavam os arremessos que nos damos? Eu escondi atrás daquela porta, através da toalha negra e do animal assassinado no teu quarto. Um bicho ruía nossas almas e tudo estava acabado. Assustava-me à noite, quando os sons do além me diziam, fuja, tem algo errado! E fui ficando e me deixando ir como um ar que passa... mas o passar virou tormenta, virou ventos que nem a meteorologia seria capaz de captar. Você lia dados e eu rolava os meus. E cada vez que eu tentava usar um paraquedas, você dizia, não precisa, vamos nos bastar, não é você, sou eu. E eu dizia, sou eu. E você. E você e eu. E num experimento de uma dança nunca realmente equilibrada, minhas metades nunca bastavam e tuas confusões me p

A louca

Eu brincava e você falava sério? Hoje acordei e pensei novamente, era uma brincadeira. Hoje corri três metros multiplicados por um milhão e sem fôlego perdi meu chão. Caí entre o limbo do meu próprio ego: cadeiras partidas e espaços lascados por um tempo sem sentido. Eu não posso te amar. E não poder por si só já é algo desejável. Desejo. E não posso. Uma eterna caça de um tigre e uma borboleta. Ou seria um lobo e sua deliciosa Chapéuzinho? Sozinha. Caço. Sozinha, despedaço. Aço. Asco de orgulho ferido. Tento em vão me polir, preciso ser brilhante, os olhos do além me observam. Mas não era esses seres de luz responsáveis por uma prometida felicidade? Os escuto? Talvez fui longe demais. Eu sempre confundo limites... Limítrofes. Eu uma menina levada que brinca entre todos os lados: o prazer e o desejo... Brinco comigo. E me elevo... Eu sonhei em ser uma deusa, uma toda poderosa mulher feita de ouro e força. E acordei assim. Hoje, o vazio me pegou e o peso dessas joias fictícias me desale

Conversa entre dois pontos A e B

A- Testando. Oi?  B- Olá? Sim, estou aqui. A- Ufa. Acreditei um instante a mais que estivesse indo embora. B-  Estava, em verdade. E por que voltaste? A-  Pois te ouvi em sonhos.  B- Sonhos?  A- Sim.  Num sonho perdido: A olha para B. A percebe que B está sem conseguir a alcançar. Será que B estaria perdido? A pensa que B poderia precisar de ajuda, então acorda. A- Por isso entrei em contato. B- Não precisava, estou bem sem você. A- Ah, sim, desculpe. No fundo, a realidade: B se desespera com o contato. Tem medo e, o medo, como sempre, faz você ficar em alerta. O alerta é a repressão de tudo. Levar outros para longe daquilo que toca seu íntimo. E assim B ficou só, como tanto queria. B- Eu não queria... Me desculpe, B, mas não estou aqui para minimizar teus atos, talvez não tenha consciência ainda, mas sim, você quis. Caso contrário teria feito diferente, sempre há outras opções quando de fato se quer.

Para além do azul e branco

Isto está cintilando. Uma peça única cheia de café dentro. Amargo. A xícara era bem bonita, continha pequenos traços suaves de azul e branco. Branco... e azul. A combinação perfeita. Céu e nuvem, unidos numa imagem panorâmica de possíveis mundos e de imaginação. Uma figura aparece entre os brancos. O azul logo atrás, como que contendo o estrondoso e barulhento do branco. Sim, o branco grita, é forte demais aos olhos. O azul acalma... traz paz. Mas não era o branco o símbolo de paz? Talvez seja, mas acredito que seja devido ao branco de uma pomba, a pomba não pode ser azul. Já viu uma pomba azul? Não, elas são brancas e em tons cinzas. Pombas! Que fofas. Ratinhos voadores. Ah, mas não esquenta, eu não tenho mais nada a ver com os ratos. Aprendi que ratos ou porcos ou tigres ou leões ou sapos são apenas imagens que eu crio para trazer para fora essa minha genialidade de inventora de mundos. Ainda continua correndo. O liquido preto vai manchando a borda branca e azul da xícara. Escorrega

A alma voltou

 Planos decididos e focados: Uma lente que se adaptou Perfeita Feita para ficar. Cansou e descansou. Tomou seu fôlego Decidiu ir E foi   Seu tom não era precário Mudava apenas com a temperança Aquela esperança De ficar e bastar.

O encontro

 Eu encontrei ele hoje. - É mesmo? E como foi? Me conta tudo! Estávamos tão bem... ah, ele abriu a porta do carro. Sim! Uma coisa esquisita, né, tudo tão cena de filme, sabe, mas ele... ah, me levou para jantar no Panorama. Sim! O melhor restaurante da cidade. Ele decidiu tudo, conforme eu disse para ele fazer. Você sabe, ele não faria tudo tão certo, se não fosse eu dando todas as dicas, né, querida. Então peguei meu cartão, deixei todo liberado para ele poder usar, já que ganho mais, qual o problema, né amiga? Ah, mas ele se comportou tão bem! Um verdadeiro gentleman... na hora de escolher o vinho, me disse que faria uma surpresa! E eu, louca que sou por eles, deixei. Amiga, o vinho era maravilhoso! Onde ele conseguiu tão bom gosto? Deve ter sido naquela viagem que ele fez e nunca imaginou me incluir nos planos dele... ou será que foi aquele amigo da Espanha que ele tanto me fala? Ah, sim, ele adora dizer que tem amigos aqui e acolá, na verdade, ele conversou quase toda a janta e seq

Teus olhos

Estava passeando no escuro dos olhos, Quando uma Luz tomou conta do Cílios. Segura de que desapareceria, A Luz insistente do passado brilhava novamente... Ah... mas eu esperei essa dor passar por inconveniente despercebido! Fingi para seu Cílios, o ensaio das Pupilas. Eu sendo Áurea de vida alegre, Não podia transparecer lágrimas, Amigas das horas tristes, Fechada em mim mesma, Com cavidades imperceptíveis, Agredia cada laço entre Cílios e a Luz. Fumaça! Fumaça! Escondia pequenos poros nos abraços. Que se piscavam um ao outro: - Luz bela e vida cheia, traz a mim pura dança de belos Cílios faceiros! - Ah queridos negros, fico mais viva vendo sua alegria... E assim, eu me petrificava cada vez mais E ao perceber que essa Luz insistente não cessava, acabei me tornando opaca, Uma Áurea já não mais colorida Não via mais porque piscar, A vingança já no final da vida, Dona Áurea se livrou do senhor Cílios e nunca mais o viu Nem sentiu sua dor pas

Três n

Susto. Eu me peguei novamente acordada. Três horas. Essas mesmas que se repetem entre outros contos. Três. Um pilar. Um triângulo repetido. Pensamento. Ideias. Antecipação. Assim que me dei conta fui tentar cair no sofá como se não tivesse pesos. Três da manhã, três toneladas, três pensamentos. Amor, ódio, indecisão. Uma dessas drogas repetidas em ecos distantes na minha cabeça: tu vai sair daqui bem. Eu explodi o último gatilho. Eu não uso armas. Me isento de me colocar em situações desconfortáveis. Eu observadora da vida. E parei de viver. Agora preciso agir. São três décadas postergando sonhos. Por outrem ou por ninguém. Minha vez. Eu me coloco acima de mim mesma. Ego é difícil. Ego. Ego. E go. E vou. Saio do quarto. Na verdade, eu já estava na sala. Quanto tempo passou sem eu perceber que tudo é breve demais? Onde foi a intensidade mesmo? São quase quatro agora. E aprecio as três. Três batidas no vidro, eu queria tanto retornar três anos e ter feito tudo diferente. Três. Diabos de

Uma borboleta no enterro

Eu não estarei aqui para sempre, disse a velha senhora. Um dia irei morrer, disse ainda, antes de descobrir sua doença. Não quero esperar a vida toda para ser feliz, mas até hoje não sabemos se foi de fato. Isso seria mais apropriado naquela lápide, uma vida toda de possibilidades de ser feliz, mas a única coisa que fazia sentido após a morte era a natureza que mantinha sua rotineira maneira de existir e frases clichês como "jaz aqui um belo espécime humano". Assim, se tivéssemos a capacidade de ver além do que nossos olhos humanos são capazes, teríamos percebido que havia uma pequena borboleta por sobre as flores daquele enterro. Abriu as asas coloridas, belas asas, e esvoaçou a cabeça de três cabeças de batatas, grandes demais: a cabeça número um era grande, curvada e cheia de depressões, como quando vemos um vale em longa distância. Parece ter algo naquela cabeça, mas não víamos por completo. Quando a borboleta passou pela segunda cabeça, estava tranquila, a imagem era ser

Fui indo

Eu não saberia te dizer, caro amigo, como eu te perdi. Simplesmente tu não estava mais lá. O número crescente subia, subia assustadoramente. Eu te pedia e te chamava e te implorava, caro amigo, me socorra! Estou rolando este documento e a conversava nunca teve início. Eu não lembro mais dela. O que falávamos? O que tínhamos tanto em comum? Eu não lembro como começamos. Era uma luz. Uma camiseta. Uma estampa? Não começamos com tantas frases? O que mudou? O silêncio está acabado agora: estou ouvindo uma música. E amigo, qual era o teu nome mesmo? Os números ao menos não são complicados: um, dois, três, e caso eu queira acrescentar algo: sete e nove. Caríssimo, tu sumiu, tu me diminuiu e tututu é o que ouço. Não me atende. O que há de novo amigo? O que novo quer dizer? Roupa, sapato, cabelo, tatuagem? E tua rotina? Tua retina? Teu olhar ainda é o mesmo? Ainda diz que sou tua? Caro amigo, escute aqui, venha me dar um adeus antes de esquecer quem tu era. Tenho certeza que sign

Acidente na Avenida

> Saquei meu cartão de vale transporte do bolso do meu jeans. Meu jeans surrado, rasgado por todos os lados. Do meu lado esquerdo havia uma senhora, parada, lendo uma revista de tricô. Carregava junto dela uma sacola onde provavelmente estariam suas linhas e agulhas. Do meu lado direito havia um homem gordo, grande, com uma barriga passando sobre sua cinta marrom e descascada pelo uso. Conseguia ver pequenas bolas vermelhas no seu pescoço, efeito do uso de camisa social apertada. Eu estava há 17 minutos aguardando o meu transporte. Os transportes daqui costumavam ser atrasados, um ônibus levava cerca de 15 minutos para efetuar o trajeto, segundo os panfletos feitos para os turistas. Devido a falta de carros e de um trânsito congestionado, ele chegava cerca de 10 minutos atrasado, quando não mais. Em outros tempos eu andava de bicicleta para efetuar o mesmo trajeto. Depois de ter sofrido um acidente na Avenida dos Zumbis prefiro o transporte coletivo. >> Ele

O lobo e sua verdade.

Muitos questionam, meus jovens, sobre o motivo de eu atacar as ovelhas. O motivo é muito simples: diversão! Elas são tão fofinhas, adoram umas gramas verdes. Eu, quando novo, adorava A Colina. Lá, encontrei o grande rebanho da minha vida. Eu as tratava muito delicadamente… foi quando ele apareceu. Aquele Garoto que todos acreditavam. Todos os dias eu o observava me difamar. Descuidado, irresponsável e imaturo! Troteava todos que o conhecia! Subia A Colina até a metade todas as manhãs e deixava as ovelhas soltas, aguardando um tempo para fazer meninices com os aldeões. Foi um dia ensolarado que eu o vi novamente aprontando a mesma cena: ia correr para a Aldeia e dizer que eu tinha aparecido. Mas desta vez, de fato! Corri o mais rápido que minhas patas permitiram, e cheguei em fronte a ele, antes de consumar a travessura. Encarei seus olhos e os vi esquivar da minha presença. Ele não conseguia pronunciar meu nome: Lobo! – Socorro! Me ajudem, me ajudem! Lobo! Lobo! Para sua

Tóxico

Lixo Passado Limpo a limpo o lixo do passado para o presente do futuro e perfeito o caminho era. Lixo era o passado Limpo, ah! limpo… o lixo do passado. Para o presente, do futuro. E perfeito, o caminho era. O lixo era. O passado limpo. Ah… limpo! (o lixo) Do passado para o presente, Do futuro e perfeito, o caminho. (era)